Artigo de pesquisador do CDMF é capa do periódico Nature Catalysis

Estudo demonstra a eficiência de nanomateriais no combate às doenças em plantas

A capa da edição de agosto da revista científica Nature Catalysis traz como destaque o artigo “Site-selective proteolytic cleavage of plant viruses by photoactive chiral nanoparticles”, que tem como um dos autores André Farias de Moura, pesquisador associado do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF). O trabalho publicado é uma demonstração da eficiência de nanomateriais no combate às doenças em plantas, com ênfase naquelas infectadas com o vírus mosaico do tabaco que, além do próprio tabaco, infecta e causa perdas significativas nas lavouras de tomate, batata e outras integrantes da família das solanáceas. Embora esse seja um vírus específico, a pesquisa mostra como nanomateriais poderão ser usados para combater outros tipos de vírus, bactérias e fungos de forma específica e eficiente. 

No cenário atual é possível observar que diversas substâncias à base de cobre têm sido empregadas para combater doenças em plantas, sendo a mais famosa delas a calda bordalesa, aplicada no tratamento de infecções por fungos. Assim, a investigação teve início com a escolha de um material ativo que, neste caso, foi o sulfeto de cobre, substância encontrada na natureza e que apresenta baixo potencial de contaminação ambiental se usada em doses baixas. 

À vista disso, uma pergunta surgiu: como aumentar a eficiência do sulfeto de cobre para que ele funcione na menor concentração possível? Para responder a essa questão, o primeiro passo foi olhar para o vírus que se deseja combater. “O vírus mosaico do tabaco tem formato de bastão com uma cavidade central em todo o seu comprimento, com cerca de 4 nanômetros de diâmetro, então isso define o tamanho máximo que uma nanopartícula pode ter para entrar no vírus e atacá-lo por dentro. Esse controle de tamanho não ocorre, por exemplo, na preparação da calda bordalesa, em que simplesmente se mistura um sal de cobre, cal e água, e todas as partículas acabam sendo maiores do que esse tamanho que queremos obter”, explicou Moura, professor do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (DQ – UFSCar) . 

A estratégia da pesquisa foi, a partir destas observações, adicionar uma molécula que controlasse o tamanho das nanopartículas na medida em que elas fossem se formando, o que no caso foi conseguido adicionando o aminoácido conhecido como penicilamina. Além de controlar o tamanho, essa molécula tem uma propriedade chamada quiralidade, o que significa que existe a penicilamina de mão direita (D) e de mão esquerda (L), aspecto que permite controlar ainda mais a forma como as nanopartículas vão atacar a cápsula do vírus, que é inteiramente feita de aminoácidos de mão esquerda. 

Moura conta que tal estratégia se demonstrou muito eficaz e possibilitou chegar em um material que inativa o vírus com concentrações muito baixas de cobre, da ordem de 10.000 vezes menos do que em uma calda bordalesa. Tão baixa que pode ser comparável, por exemplo, à concentração de cobre na água que provém do aquecimento solar doméstico.

A gente ouve falar bastante em medicina de precisão, em que cada pessoa terá no futuro um tratamento com remédios personalizados. Essa personalização significa encontrar o remédio mais efetivo para a doença específica que se quer tratar e com o mínimo de efeitos colaterais. O que demonstramos neste estudo é essa mesma ideia aplicada à agricultura. Mostramos como é possível se tratar uma doença de planta com um defensivo químico praticamente inócuo para a planta e para o meio ambiente, mas muito eficiente. Essa mesma filosofia pode ser aplicada a qualquer doença causada por vírus, bactérias ou fungos – basta otimizar um nanomaterial para cada caso”, explicou. O grupo de pesquisadores do qual Moura faz parte está finalizando a investigação de uma nova nanopartícula de sulfeto de cobre, também quiral, mas com forma e tamanho diferentes, e que se mostrou ativa contra o SARS-CoV-2. Isso mostra como é possível aproveitar o aprendizado de uma investigação para acelerar as pesquisas em temas correlatos.

Um trabalho desta envergadura demanda uma equipe grande, devido, principalmente, à necessidade de reunir especialistas de diversas frentes, por isso participaram do grupo investigadores da UFSCar e do CNPEM, no Brasil, da Universidade de Michigan e da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, e da Universidade de Jiangnan, na China. A equipe de pesquisadores foi formada por Rui Gao, Liguang Xu, Maozhong Sun, Manlin Xu, Changlong Hao, Xiao Guo, Felippe Mariano Colombari, Xin Zheng, Petr Král, Chuanlai Xu, Jinguang Yang, Nicholas A. Kotov e Hua Kuang.

“É importante salientar que em cada uma dessas instituições participantes existem projetos de financiamento de grande porte, capazes de sustentar a pesquisa em temas complexos. Em particular, ressaltamos que aqui no Brasil contamos com o apoio da FAPESP ao CDMF e do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), que nos deu acesso aos recursos do supercomputador SDumont – ambas fundamentais para a realização das simulações computacionais realistas que nos permitiram compreender os mecanismos de ação das nanopartículas na inativação dos vírus”, finalizou Moura.

CDMF

O CDMF, sediado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e recebe também investimento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a partir do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia dos Materiais em Nanotecnologia (INCTMN).

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O Laboratório Aberto de Interatividade para Disseminação do Conhecimento Científico e Tecnológico (LAbI), vinculado à Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), é voltado à prática da divulgação científica pautada na interatividade; nas relações entre Ciência, Arte e Tecnologia.