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Um artigo publicado na revista Journal of Materials Chemistry A com conclusões que podem impactar consideravelmente o desenvolvimento de sensores de gás foi incluído numa seleção de artigos de destaque (HOT articles) pela Sociedade Real de Química do Reino Unido, responsável pela publicação do periódico. Devido ao destaque — augerido pelos revisores e restrito a 10% dos artigos publicados no ano pela Sociedade considerados os mais importantes — o trabalho ficou disponível gratuitamente por 6 semanas a partir da publicação. Na pesquisa, utilizando simulações computacionais teóricas avançadas, a equipe modelou e analisou mecanismos sensores do dióxido de estanho (SnO2) e descobriu condições que permitem sua ativação com grande eficiência energética.
Sensores de gás com melhor desempenho são uma demanda tanto para monitoramento ambiental quanto para segurança, uma vez que vazamentos de gás podem causar danos graves e inclusive risco de vida. O princípio do funcionamento de um sensor de gás baseado em semicondutores de óxidos metálicos (como o SnO2) é a variação da resistência elétrica do material ao ser exposto a um gás alvo. Mais precisamente, reações de oxirredução na superfície provocam uma transferência de elétrons, levando a uma mudança na resistência elétrica, o que gera o envio de um sinal elétrico.
“Quando falamos em superfícies de semicondutores, esses semicondutores possuem defeitos”, explica Amanda Gouveia, pesquisadora da Universidade Jaume I, na Espanha, e uma das autoras do artigo. “Uma das particularidades das superfícies é a presença de vacâncias de oxigênio, que são átomos de oxigênio que ‘foram embora’ da rede quando você cortou o material e construiu a superfície”, prossegue a pesquisadora, referindo-se à rede cristalina que forma o material a partir do qual é criado o modelo de superfície. Ela explica que, ao se introduzirem novas vacâncias de oxigênio, ocorre uma redistribuição de elétrons, o que estabiliza o material, criando uma região neutra chamada polaron. “E qual é o processo do sensor? Você tem que ativar essa molécula de O2, ela vai chegar na superfície para depois ter a dissociação [a separação dos dois átomos que compõem o O2] e a oxidação de CO [resultando em CO2]. É um processo que ocorre em cadeia, por isso no artigo nós propusemos o mecanismo, o perfil de energia no qual pode ocorrer essa interação do oxigênio e do CO na superfície do SnO2. Temos que pensar que é um ciclo: o oxigênio vai precisar desses elétrons redistribuídos na rede para que ocorra a sua dissociação, seguida da formação das espécies ativas de oxigênio, que podem reagir posteriormente com o CO”.
No mecanismo analisado pela equipe, a dissociação do O2 e a oxidação do CO ocorrem simultaneamente, o que torna o processo muito eficiente energeticamente. Essa descoberta revela uma interação entre as vacâncias de oxigênio e os polarons eletrônicos. A identificação dessa interação não apenas amplia a compreensão sobre os fatores estruturais e eletrônicos por trás das propriedades sensoras do SnO2 como fornece informações cruciais sobre a relação entre defeitos dos materiais e seu desempenho no sensoriamento, o que pode levar ao desenvolvimento de sensores mais eficientes.
Além de Gouveia, assinam o artigo “Effective sensing mechanisms of O2 and CO on SnO2 (110) surface: a DFT study” Felipe Lipsky, Fabrício R. Sensato, Mónica Oliva, Elson Longo, Miguel A. San-Miguel e Juan Andrés.
CDMF
Com sede na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e dirigido pelo Prof. Dr. Elson Longo, o CDMF é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e recebe também investimento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a partir do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia dos Materiais em Nanotecnologia (INCTMN).